A desproporcionalidade da lei de drogas
Os custos humanos e econômicos da atual política do Brasil
A presente publicação divulga os resultados da parte brasileira de uma pesquisa latino-americana estruturada por meio do CEDD – Coletivo de Estudos Drogas e Direito -, sobre a proporcionalidade das normas jurídicas que proíbem e punem criminalmente as condutas relacionadas a algumas drogas, definidas como ilícitas por listas internacionais incorporadas ao direito interno. Uma primeira versão deste trabalho em espanhol fez parte do livro Justiça Desmedida: Proporcionalidad y Delictos de Droga en América Latina, organizado por Catalina Pérez Correa e publicado pela Editorial Fontamara, em 2012. O presente artigo, agora publicado em português, mantém a mesma versão, mas incorpora dados penitenciários brasileiros mais recentes, de forma a não perder a atualidade do texto, sendo mantidas as conclusões.
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A pergunta básica dessa pesquisa pode ser resumida na seguinte frase: as normas penais que punem condutas relacionadas a (algumas) drogas são proporcionais em relação aos bens jurídicos e sociais que pretendem proteger e aos custos humanos e financeiros que essas próprias normas impõem à sociedade?
Para responder a essas perguntas, a pesquisa inicialmente submeteu as normas penais sobre (algumas) drogas a um teste normativo, à luz do princípio jurídico-constitucional da proporcionalidade, adaptado às normas penais. Em seguida o trabalho submeteu essas mesmas normas a um teste concreto/empírico, apontando efeitos dessas normas em termos de custos humanos e financeiros.
Como se pode ver da leitura do trabalho, os resultados são claros e chocantes. Criadas para proteger o bem jurídico saúde pública, as normas penais sobre (algumas) drogas, na realidade, geram encarceramento em massa, prisões de cidadãos cumpridores das leis como traficantes, e uma verdadeira tragédia humana quando se trata de mulheres.
Além disso, as normas penais sobre (algumas) drogas são as que mais sofreram alterações desde a primeira lei penal brasileira, sempre aumentando o escopo punitivo e a quantidade de pena prevista. Como resultado, as normas penais sobre (algumas) drogas geram penas médias mais graves que as de estupro, roubo, e são muito próximas das penas de homicídio. Conforme também demonstrado pela pesquisa, essas penas são as principais responsáveis pelo aumento massivo da população carcerária desde 2006, quando a atual Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006) entrou em vigor. E ainda há projetos no Congresso Nacional para aumentar essas penas, como o PLC 37/2013, atualmente em tramitação no Senado Federal.
Os vários gráficos, tabelas, análises normativas e narrativas fáticas presentes no trabalho falam por si sós, mas o acúmulo desses dados – alguns deles já bem conhecidos dos estudiosos da área penal – e a sua relação com as exigências de coerência e racionalidade do princípio da proporcionalidade apontam todos para uma só conclusão: as normas penais que punem condutas relacionadas a (algumas) drogas no Brasil são normativamente desproporcionais, não atendem aos seus fins jurídicos e empíricos e, ao contrário, geram efeitos nefastos para a sociedade e para a ordem jurídica. Por isso, essas leis precisam ser mudadas o quanto antes.
Os autores agradecem os comentários e críticas à primeira versão do texto, que permitiram o aprimoramento desse trabalho, feitas por Maurides Ribeiro, Christiano Fragoso, Pien Metaal e Alejandro Corda, cujas críticas e considerações foram incorporadas ao texto final.
Espera-se, com a presente publicação, trazer dados e reflexões à tona, ampliando o debate de ideias sobre as políticas sobre substâncias psicoativas no Brasil e, assim, poder contribuir para uma necessária mudança de rumos das leis de drogas em nosso país.